Entre a queda e o assombro

Neste último domingo, Otto se machucou na igreja. Depois de ministrar, eu estava orando com algumas pessoas na frente, com Naty ao meu lado, mas logo fui interrompido por ela, que desesperada disse: "Otto caiu!". Quando olhei, vi sua boca cheia de sangue, uma janela aberta e um choro estridente de desespero. Era como se o meu pequeno olhasse para mim e dissesse: "Pai, me ajuda!".

Fui em direção ao banheiro e, quando fui lavar sua boca, percebi a perda de um dos seus dentes e outros três abalados, sendo que um estava apenas preso na gengiva. Otto me olhava com um misto de dor e preocupação por uma possível repreensão, mas o que eu queria na verdade era trocar de lugar com ele, mas isso era impossível. Joguei bastante água para lavar o machucado, até que Natália reunisse as coisas para que pudéssemos ir em busca de ajuda.

Saí depressa, cumprimentei de longe quem ficava e fui em direção ao carro. Alguns irmãos ainda procuravam seu dentinho, na esperança de recolocá-lo. Ligamos em diversos locais, não havia plantonistas, odontólogos especialistas. Alguns amigos e irmãos começaram a tentar contatos.

Eu estava nervoso, mesmo depois de um domingo tremendamente abençoado. Um misto de vazio e indignação nasceu dentro de mim: "Como Deus não está cuidando da gente? Estamos fazendo sua obra." "Afinal de contas, o Senhor não disse que enquanto cuidamos das suas coisas, Ele cuida das nossas?" "Isso é verdade?". Pequei. Estava questionando o cuidado de Deus. Minha parte humana gritava alto, percebi o quão limitado eu era. A irritação ocupou o lugar da convicção em fé. Eu estava bravo, chateado, não só comigo, com Deus também. Eu não conseguia perceber que poderia ter sido pior, que algo mais terrível podia ter acontecido. A minha ira circunstancial mostrou-me o quão limitado e perdido eu estava. A minha fé precisava ser trabalhada. Eu estava cego, completamente sem chão.

Depois de trinta minutos rodando pela cidade, conseguimos uma odontóloga a 25 minutos de onde estávamos. Saímos em direção ao consultório, não tínhamos ideia ainda do que poderia ser feito, se poderíamos recuperar o dente perdido, se poderíamos colocá-lo de novo, nada. Então pedimos ao Marco e Daí que insistissem em procurar o dentinho até que chegássemos ao local. Eles foram, procuraram, reviraram as cadeiras, passaram até mesmo o rodo no salão da igreja, mas infelizmente não encontraram. Ligaram frustrados, mas agradeci o cuidado deles conosco enquanto chegávamos à odontóloga.

Quando ela nos atendeu, fez um raio X, e nos disse: "Papai, mamãe, não existe possibilidade de reimplantar dente aqui, até porque é de leite e daqui a 4 anos já cairia de qualquer maneira. Mas não para por aí: além disso, vai precisar fazer a remoção de mais 1 ou 2 dentes, pois estão sem condição alguma de se manterem, as raízes estão pequenas, no estilo teto de igreja". A frustração tomou conta da gente, fiquei quieto, um silêncio pálido. Comecei a me achar um péssimo pai e a culpa silenciosamente começou a ocupar meu coração. Ela passou medicamentos e pediu que procurássemos uma especialista em odontopediatria.

Entramos no carro, partimos sem endereço, um silêncio avassalador estava diante de nós. Olhei o telefone, uma indicação de outra médica, então ligamos. Ela se prontificou a atender. Estávamos a quilômetros de distância, aceleramos o máximo para chegar logo. No caminho, Otto pediu sorvete. Tínhamos feito a promessa mais cedo diante da recomendação da dentista. Paramos em uma sorveteria. Ele, com os lábios inchados, cortados da pancada no chão, começou a provar o sorvete, e logo começou a esboçar um sorriso, que até então estava embotado pela dor. Tito, o mais novo, começou a fazer graça e, pela primeira vez, ele sorriu. Por dentro, chorei. Pagamos o sorvete e fomos até a Tia Ju, que nos atenderia.

Chegamos lá, e ela começou a brincar, descontraí-lo, tirá-lo do centro do furacão dominical trágico. E assim ela fez, com maestria, criou um universo: óculos do Hulk, aparato da Patrulha Canina, lanternas, laser... etc. A odontologia virou um multiverso, onde o dente era apenas mais uma missão dos heróis naquela colorida sala. E o corajoso Otto não era mais protagonista da queda, mas da força e do enfrentamento. Um combinado entre a Dra. e ele: "Coragem", ela disse. Ele respondeu com um: "Deixa comigo". A dor virou uma missão necessária, transpô-la, enfrentá-la, o único remédio para algo melhor.

Terminando a aventura, ela veio até nós em particular e disse: "Papais, fiquem bem, ele está saudável, está de pé. Imaginem o livramento, poderiam estar em outra emergência de algo muito mais doloroso para vocês. Criança que cai é criança que está correndo, saudável, de bem com a vida. Vejam o quão grande presente vocês têm nas mãos, não deixem que o coração de vocês produza culpa e tristeza. Não se sintam mal por isso, só ajudem-no a levantar, a ficar bem. E vocês precisam fazer isso juntos."

Ali minha ficha caiu, me dei conta do quão tolo fui por questionar Deus pelo seu cuidado. Na verdade, o Senhor cuidou de tudo: o local era baixo, não foi uma queda tão expressiva, apesar do dano causado; pessoas próximas viram rapidamente e o ajudaram, conduziram ele até nós. Ele não esteve sozinho, nós o acolhemos. Poderia andar, correr, brincar, se divertir. As pessoas mobilizadas em servir em amor, ligando, se oferecendo no que poderiam fazer. Deus estava no controle o tempo todo, guardando-o do pior. Só eu que estava aborrecido, chateado, e não conseguia ver isso. Agia como se tivesse direito de colocar Deus na parede. Pedi perdão a Deus, era tudo desespero e agonia de um pai em processo pedagógico. Sei que estamos debaixo do cuidado do Senhor. Agradeci a Deus por levar meu pequeno para casa, por vê-lo sorrir e brincar, curtindo uma nova janela de aprendizado.

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